sim título
mais uma vez venho exibir-me?
falar de mim ad nauseam
dizer o que sou
e o que não
as minhas opiniões
em transição, insustentáveis
os meus problemas
sejam quais forem
simplesmente estúpidos
/minúsculos
mas a boca já não quer falar
dos lábios
dos dentes
da língua
do céu da boca
a boca tornou-se pedra
e não quis mais falar
de mim
de /\/\/
do que poderia
e do que não
o olho, que nada vê, imagina algo mais
além do olhar des humanes
por detrás desses pesados muros
e o que não se vê está tão perto
seres capazes de sentir dor
são utilizados como meio de transporte
e sofrem
seres capazes de sentir medo
são espancados pelos seus domadores
e açoitados e humilhados nos circos
e sofrem
seres que anseiam, talvez, por um abraço
ou a tranquilidade do repouso
ou o sabor da liberdade
são reduzidos a uma coisa
a uma função
a uma vida de escravatura
e tratados como se não tivessem dignidade
como se nada
e sofrem
mães, filhos, companheires na vida
de merda
que tiveram e têm de viver
por serem de outra espécie
são violades
espremides
martirizades
até o dia em que
acabam por ser cortades em
dois, quatro, tantos
pedaços quantos
forem necessários
e a vida continua
o ser humano goza e chora
sobe e dece
funda e também destrói
e atrás
invisíveis apesar de seres como nós
elas, eles, es outres animais
a gemer ainda
/sem voz
fotografia
nesta imagem, por exemplo
alguns vêem uma família feliz
outros, cavalos tristes, cansados
com os seus escravizadores, à vontade
nas suas costas
/\/\/ 2023